Jussara e Silvinha são amigas há 26 anos. Kleber nasceu pouco mais de uma década depois das meninas e se juntou a elas anos mais tarde. Além de amigos, eles são guerrilheiros de uma batalha que já devia ter sido ganha: a do racismo.
Jussara- hoje psicóloga – cresceu no Paineiras rodeada de meninas brancas. Sua mãe, consciente racial, preocupou-se ao perceber que não havia pessoas ao redor da garota com as quais ela pudesse se identificar e a colocou, com 13 anos, no grupo do Mestre Marcial, na Academia Amukenguê.
Lá estava Silvinha – designer de moda africana atualmente -, com a mesma idade, que tinha uma vivência completamente diferente da garota que há pouco chegava. Elas precisaram de poucos minutos para o início de uma identificação.
Kleber, publicitário, sempre foi inquieto. Já era conhecido de Jussara desde menino e se aproximou da amiga ao convidá-la para palestrar, na época, em um coletivo da faculdade, o Palmares.
Caminhos diferentes, lutas iguais e conclusões inquestionáveis sobre o preconceito racial no século XXI: “o racismo de hoje é velado”, afirma Jussara diversas vezes durante a nossa conversa!
O gerador de lero-lero do presente pode até pensar que seja mais fácil ser negro no Brasil de hoje, “mas não é, aliás, nunca foi”, Kleber ressalta várias vezes. Apesar de existir mais recursos para se discutir isso, muitos não querem ouvir, optam por não enxergar e negam os dados que comprovam que ainda tem preto morrendo, vivendo sem estudo e sendo negado na entrevista de emprego – quando chegam até essa fase.
Ouvir que “vai ter preto na faculdade, sim” faz até nascer a esperança de dias melhores, mas ver que “na realidade ele é só um preto com diploma”, como desabafa Silvininha, é desanimador. O que vai ser depois? A escolha será se jogar ao empreendedorismo depois de ficar exausto de percorrer o mercado de trabalho e ser negado? Ou conseguir emprego e ser uns dos primeiros a ser demitido por serem os mais “braçais”?
Os três vozeiam que querer passar pano na construção do Brasil não é uma opção e gritar aos quatro ventos que a riqueza de qualquer família deste território, independente do sobrenome, vem de suor negro é necessário.
Que possam existir negros dividindo a bancada do governo, sendo doutores em faculdades ou defendendo a lei atrás de tribunais. Que eles ocupem todos os lugares, ganhem seus espaços e cheguem onde sempre sonharam sem ter que sofrer para isso, nem se provarem.